Habituais nas
farmácias caseiras
A naturopatia está
na moda. Que tal uma chávena de chá de camomila ao deitar em vez de um
comprimido? O biólogo Jorge Nunes revela as propriedades medicinais e
aromáticas das espécies vegetais autóctones mais usadas na medicina
tradicional.
"Os desesperados
agarram-se às silvas!”, dizia a Ti Piedade enquanto o corpo negro e cansado
se curvava sobre os matos espinhosos e as mãos vetustas e calejadas iam
ripando as flores da carqueja. “Principalmente, quando já não aguentam os
males da boca ou a soltura dos intestinos… e não falo de chupar amoras
pretinhas, não senhor...”, acrescentava com um sorriso malandreco.
Momentos mais tarde,
ao passar por um silvado florido, fez questão de mostrar que não estava mesmo
a referir-se às deliciosas amoras tão apreciadas como frutos silvestres, mas
às pontas das silvas: “Folhas tenrinhas e flores fechadas, vê?” Depois de
fervidas e bem filtradas – “têm muitos picos, é preciso ter muito cuidado!”,
advertia –, servem para bochechar (curam aftas, dores nas gengivas e outras doenças
da boca) e, em tisana, aliviam a diarreia (“soltura”, “desarranjo” ou
“destempero”, como é uso chamarem-lhe no mundo rural).
Amparada por um
varapau, que a ajudava a suportar o peso dos seus quase noventa anos, não
perdia o ritmo e avançava com passo ligeiro por entre os tojos e as urzes
ressequidas. Do braço esquerdo pendiam dois sacos de plástico com logótipos
desbotados de uma grande superfície comercial. Os sinais das catedrais do
consumo já chegaram às serranias remotas de São Pedro do Sul. Enquanto as
flores de carqueja iam enchendo o saco maior, o mais pequeno permanecia quase
vazio. “É do hipericão”, esclarecia sem abrandar a passada, “mas, com este
calor, já nem se encontra, está todo mirradinho!”, justificava a dona
Piedade.
A carqueja recolhida
naquela tarde ainda precisava de mais alguns dias para secar e ser
devidamente acondicionada. Depois, ficaria a aguardar a chegada dos rigores
invernosos, das gripes e tosses trazidas pelas chuvas fortes, pelos mantos
brancos de neve e pelos ventos gélidos que costumam atravessar de forma
inclemente os maciços de Montemuro e da Gralheira. As “Terras do Demo”, como
tão oportunamente lhes chamou Aquilino Ribeiro, o grande romancista
beirão.
Embora aquele dia
tivesse servido essencialmente para a apanha da carqueja e do
hipericão-bravo, a anciã acabou por confidenciar que a sua farmácia caseira
incluía um sem-número de outras “ervinhas milagrosas”, que ia recolhendo ao
longo de todo o ano. “Ervas que fazem bem a tudo” e que mantém guardadas em
frasquinhos e saquinhos, prontas para quando houver uma ferida, uma tosse,
uma diarreia, uma febre ou uma gripe.
Mézinhas das nossas avós
O relato, colhido,
juntamente com a carqueja e o hipericão, no distrito de Viseu, poderá parecer
apenas mais uma recolha etnográfica, igual a tantas outras memórias que se
vão apagando à medida que as comunidades rurais entram em declínio por causa
do êxodo rural e do desaparecimento dos seus anciãos, portadores de importantes
saberes e tradições que acabam por ser enterrados com eles, muitas vezes, sem
que haja qualquer hipótese de serem legados às gerações vindouras, como
acontecia antigamente. Porém, basta percorrer qualquer aldeola portuguesa
para se perceber que o rol de utilizações das ervas é infindável e que,
afinal, este relato poderia muito bem ter sido gravado em qualquer outra
região. Por todo o país, do nordeste transmontano ao Barrocal algarvio,
passando pelas ilhas-jardim, são muitas as pessoas, nomeadamente os mais
velhos, que continuam a recolher da natureza as plantas com poderes
curativos.
Desde tempos que a
memória já não lembra, sempre se aproveitaram as virtudes das plantas que
floresciam espontaneamente por montes e vales. Mas “quem tem tesouros não os
exibe”, diz o povo. Por isso, não é de estranhar que, no início, as panaceias
e mézinhas fossem saberes privados guardados sigilosamente como se de
tesouros familiares se tratasse. No entanto, com o passar dos séculos,
foram-se tornando públicos e acessíveis a toda a comunidade. E, tal como no
folclore e na gastronomia, também nas ervas medicinais cada região tem a sua
tradição. Nem poderia ser de outro modo, porque a distribuição das plantas é,
por vezes, circunscrita a determinadas zonas de acordo com os fatores
climáticos e edáficos que as influenciam. Não é, por isso, de estranhar que
existam diferentes “receitas” para o mesmo mal. É caso para dizer: cada
avózinha, sua mézinha!
Do campo para a
cidade
A utilização das
plantas, quer para fins alimentares quer medicinais, é quase tão antiga como
o próprio homem. Embora o seu uso medicinal seja habitualmente conotado com
práticas mais ou menos obscurantistas, que persistem sobretudo no bucólico da
ruralidade, as plantas não servem apenas para tratar as maleitas dos nossos
camponeses. Nas grandes cidades, apesar de muito deste património cultural se
ir desvanecendo, assistimos na atualidade a um regresso às origens, em busca
daquilo que a terra nos dá. Prova disso é que não haverá casa portuguesa sem
o cantinho das ervas: a erva-cidreira para as perturbações gástricas, a tília
para febres e doenças hepáticas, a camomila para a gripe, entre muitas outras
que cada um escolhe a seu bel-prazer.
Muitas das mézinhas
das nossas avós, a que é usual chamar “medicina tradicional”, “natural” ou
“verde”, coexistem, afinal, com a medicina convencional, dos médicos, na qual
abundam cocktails químicos injetáveis, xaropes industriais e drageias de
todas as cores e feitios.
Ainda que não haja
dados estatísticos sobre o número de pessoas que recorrem à medicina natural,
uma vez que se trata de autoconsumo e não são necessárias receitas médicas
para este género de terapia, pensa-se que a naturopatia está em crescendo.
São cada vez mais os adeptos da medicina verde. Em suma, quando o objetivo é
acalmar a alma, fortalecer o corpo e aliviar a dor, ninguém se importa de
onde vem o remédio, desde que se revele eficaz.
Formas sugestivas
Não é difícil
imaginar por que razão algumas plantas começaram a ser utilizadas como
curandeiras. Basta olhar para elas. As suas formas sugestivas, imitando
órgãos do corpo humano, terão despertado a curiosidade e levado ao seu
emprego na cura das maleitas a eles associadas. Estas crenças originaram, nos
séculos XVI e XVII, a chamada “doutrina das assinaturas”, segundo a qual Deus
teria indicado as virtudes de cada planta dando-lhe uma forma similar ao
órgão sobre o qual atuava. Por exemplo, os tubérculos de certas orquídeas,
que se assemelham aos testículos humanos, possuiriam propriedades
afrodisíacas, e as folhas das hepáticas, em forma de fígado, seriam indicadas
para os problemas relacionados com esse órgão. Ou então, dando-lhe um aspeto
idêntico aos sintomas externos de determinada doença (as ervas com seiva
amarela, como a celidónia, eram utilizadas no tratamento da icterícia, o feto
polipódio era usado para curar a varicela, pois os seus esporângios, situados
na página inferior das folhas, assemelham-se às pústulas originadas por essa
doença). Embora nem sempre se verificasse a tão almejada cura, cedo se
percebeu que quase todas as plantas possuíam propriedades medicinais, que
compuseram o vasto leque de conhecimentos empíricos legados às gerações
vindouras.
A doutrina das assinaturas estendeu-se de igual modo
aos fungos: o exemplo mais conhecido é o do cogumelo porra-de-lobo ou
picha-de-cão (Phallus impudicus), ao qual, devido à sua forma idêntica
ao pénis humano, foram também atribuídas propriedades afrodisíacas. Entre os
líquenes, destaca-se a pulmonária (Lobaria pulmonaria), que foi
largamente utilizada no tratamento das úlceras pulmonares, em virtude da sua
semelhança com um pulmão.
Embora estas crenças
nos possam parecer ridículas no presente, é compreensível que, na
antiguidade, se tenha entendido as formas das plantas semelhantes a órgãos
como sinais divinos. Em pleno século XXI, muitos camponeses sem a influência
dos ensinamentos escolares e dos conhecimentos científicos continuam a vê-las
como tal.
Curar sem químicos?
A utilização das
plantas com propósitos medicinais vem de há longa data; no entanto, o papel
fundamental que lhes era atribuído na medicina da Idade Média foi-se
desvanecendo com os avanços científico-tecnológicos da era moderna. Hoje em
dia, muitos dos seus princípios ativos já são sintetizados artificialmente,
através da biotecnologia a que recorre a indústria farmacêutica. Apesar
disto, ainda existe uma considerável percentagem de medicamentos prescritos
pelos médicos que resulta da utilização direta de plantas, sobretudo quando a
síntese artificial do princípio ativo não é conseguida ou não é
economicamente favorável.
Segundo o
Decreto-Lei 176/2006, é definido como medicamento à base de plantas “qualquer
medicamento que tenha exclusivamente como substâncias ativas uma ou mais
substâncias derivadas de plantas, uma ou mais preparações à base de plantas
ou uma ou mais substâncias derivadas de plantas em associação com uma ou mais
preparações à base de plantas”.
Permanece, contudo,
o preconceito de que as ervas medicinais recolhidas na natureza são boas para
a saúde porque não têm químicos, o que não é verdade. A razão por que são
usadas para fins curativos é exatamente porque possuem determinadas
substâncias químicas que vão influenciar a fisiologia do organismo. Eduardo
Ribeiro, biotecnólogo e especialista em suplementos alimentares e plantas
medicinais, lembra que “uma planta medicinal é constituída por um complexo
conjunto de moléculas com efeitos fisiológicos comprovados, mas cuja ação ao
nível do organismo não é facilmente percecionada”.
Através do seu
metabolismo, quase todas as plantas conhecidas produzem substâncias com
propriedades medicinais ou odoríferas, como esteróides, alcalóides, óleos
essenciais, taninos, vitaminas, elementos minerais e antibióticos, entre
muitas outras. Dito de outro modo, possuem determinado princípio ativo que
lhes confere valor terapêutico. Por isso mesmo, terão sido empregadas, de
acordo com estudos antropológicos, desde o Paleolítico, embora os vestígios
farmacêuticos mais antigos nos tenham chegado das civilizações mesopotâmica e
egípcia.
Para além da
utilização que se vai fazendo das plantas, principalmente pelos habitantes
das zonas rurais e pelos clientes da naturopatia, a indústria farmacêutica
não deixa de procurar novas propriedades curativas nas plantas silvestres.
Embora a medicina convencional não reconheça completa validade terapêutica à
naturopatia, é absurdo desprezar alguns tratamentos centenários da medicina
popular, muitos deles com eficácia comprovada. Quem nunca bebeu chá de
camomila como calmante, tomou mel com limão para curar as dores de garganta,
bebeu chá de cidreira para as dores de estômago ou tomou xarope de cenoura
para a tosse? Quantas vezes as mézinhas de fabrico caseiro, passadas de
geração em geração, fazendo parte da identidade cultural de um povo,
solucionam os problemas de saúde e restabelecem o bem-estar, sem necessidade
de apoio médico? Muitas dessas receitas caseiras podem ainda ser ouvidas da
boca dos sábios rostos enrugados pelos anos, em qualquer das muitas aldeias
de Portugal, que teimam em manter vivos os costumes e tradições.
No entanto, embora
use produtos naturais culturalmente muito interessantes, a verdade é que a
medicina natural pode apresentar alguns riscos, nomeadamente quanto ao
controlo de qualidade, à utilização indevida e aos efeitos secundários em
determinadas doenças, como avisa Elsa Gomes, professora aposentada da
Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa.
Em muitos casos, a
medicina convencional coexiste com as medicinas popular e alternativa. Os
doentes, consoante os resultados obtidos com os tratamentos, dividem a sua
crença entre médicos e “curandeiros”, “endireitas”, “sábios”, “bruxas” e
“homens de virtude”. Apesar de os efeitos farmacológicos de muitas mézinhas
estarem ainda por investigar e comprovar, a medicina moderna vai aprendendo a
conviver com alguns desses remédios populares; de facto, quando a medicina
ainda dava os primeiros passos, já o povo tinha remédios para a maior parte
das maleitas.
“A elaboração de remédios caseiros está também hoje
em dia facilmente acessível via internet, sendo possível aprender como
fazê-los e quais as suas indicações.” Quem o afirma é o médico Luiz Santiago,
autor de Medicamentos e Corpo – Consumidores de Fármacos: o que
Pensam e o que Sabem... “No entanto, dose e posologia são duas
grandes lacunas que se observam, quando consultada a informação”, alerta.
Curativas e
aromáticas
Além das
propriedades medicinais, culinárias e cosméticas, muitas plantas são
utilizadas para a elaboração de estupefacientes. Por exemplo, a dormideira,
parente próxima das nossas papoilas, é cultivada na Índia, no Egito e na
China para a obtenção de ópio. Esta droga, já conhecida na antiguidade,
fornece numerosas substâncias medicinais: morfina, codeína e papaverina. Da dormideira,
obtém-se ainda um óleo idêntico ao do girassol, sendo muitas vezes utilizada
como alimento. Só de uma parte insignificante da planta, o látex das
cápsulas, se obtêm os alcalóides opiáceos, com larga utilização na medicina
moderna, onde são usados como calmantes e antiespasmódicos.
Os extratos de
plantas empregam-se para preparar diversas soluções medicinais, das quais
resultam tinturas, essências e sucos usados para elaborar xaropes (bebidas
que resultam geralmente da maceração de várias plantas), infusões (bebidas
feitas com o aproveitamento do líquido resultante da fervura dos vegetais),
pomadas e emplastros (ervas, frescas ou cozidas, intactas ou maceradas,
aplicadas sobre a zona afetada) e inalações (plantas vertidas num recipiente
com água a ferver do qual se inala o vapor).
As ervas aromáticas
são usadas na indústria alimentar e na cozinha dietética. Aliás, a
gastronomia tradicional, característica de cada região do país, vive muito do
toque especial que lhe é dado pelas ervas. Algumas dessas plantas têm
presença obrigatória em vários pratos: os coentros na sopa de peixe, os
cominhos nas tripas à moda do Porto, os orégãos nos caracóis, a salsa no
bacalhau à Brás, o louro e o alho no coelho à caçador, a hortelã no arroz de
maranho, etc.
A grande maioria das plantas consideradas úteis foi
domesticada, existindo já variedades de cultivo. Deste modo, as indústrias
farmacêutica e alimentar têm-nas sempre à disposição, sem dependerem da
mãe-natureza para as obter quando precisam. Mas nem sempre assim é. Muitas
vezes, as “plantas milagrosas” ainda continuam a ser recolhidas nos espaços
naturais. Embora isso não seja preocupante quando é realizado pelas
populações locais para consumo próprio, pode assumir graves proporções quando
se trata de colheita indiscriminada e pouco escrupulosa, realizada para
saciar os apetites gulosos do comércio florescente de produtos naturais.
Servem de exemplo desta recolha desregrada, com a agravante de ocorrerem em
áreas protegidas, a salva-brava (Phlomis lychnitis) colhida no Parque
Natural das Serras de Aire e Candeeiros para ser enviada para a América, e o
hipericão-do-Gerês (Hypericum androsaemum), coletado no Parque
Nacional da Peneda-Gerês e vendido localmente para chá.
Ainda que as plantas
medicinais e aromáticas devam ser consideradas como um recurso económico que
as populações locais podem explorar, a inexistência de legislação que
regulamente o setor favorece a venda de gato por lebre e pode pôr em perigo
algumas espécies. Impõe-se, por isso, a criação de regulamentação e
fiscalização adequadas à exploração sustentável deste recurso natural.
Para a dona Piedade,
alheia às leis dos homens, a tradição será mantida enquanto viver: “Se Deus
quiser, no próximo ano voltarei às ervinhas…Preciso delas para chegar aos
noventa!”, dizia com um sorriso, muito alegre, que parecia apagar por
momentos as rugas profundas e o sofrimento de uma vida penosa. Pois que seja
feita a sua vontade!
J.N.
Colheita e uso das plantas
A recolha de plantas
com potencialidades farmacêuticas e culinárias pode ser um passatempo interessante,
que alia a medicina tradicional a um mais profundo conhecimento e respeito
pela natureza. No entanto, não basta sair por aí a colher indiscriminadamente
todas as plantas, é necessário conhecer muito bem as “ervas” e as suas
propriedades. Eis alguns conselhos.
Utilize somente as
plantas cujas propriedades estejam devidamente identificadas. Lembre-se de
que os ingredientes ativos das plantas variam, tanto em quantidade como em
qualidade, ao longo do ano.
Certifique-se de que
identificou corretamente a planta e que nenhuma outra espécie vem misturada.
Nunca efetue
recolhas em áreas que tenham sido pulverizadas com inseticidas ou pesticidas
ou que tenham sido estrumadas recentemente. Na recolha de plantas aquáticas,
evite águas poluídas.
Conheça quais as
partes da planta que podem ser utilizadas na medicina natural. Por exemplo,
na batateira, o tubérculo (batata) é um precioso alimento, enquanto a parte
aérea é venenosa.
Recolha apenas a
quantidade necessária, e sempre que possível evite arrancar a planta: muitas
vezes, as partes úteis são apenas as folhas, as flores ou os frutos.
Evite a utilização
de um remédio vegetal quando já está a ser alvo de um tratamento convencional
receitado pelo médico. O efeito de duas “drogas” pode ser muito prejudicial.
Fale abertamente com o seu médico sobre este assunto.
Nunca apanhe plantas
raras ou em perigo de extinção, nem faça recolhas em áreas protegidas.
As “plantas
milagrosas” também têm os seus riscos: peça apoio a um especialista.
Quem não seja dado a
grandes passeios campestres ou não queira correr riscos, garantindo a
salvaguarda da natureza, encontrará a grande maioria destas ervas em qualquer
supermercado, dietética ou ervanária.
Farmácia caseira
Quando se fala de
primeiros socorros, a medicina popular é bastante simples e prática: se
existe ferida, aplica-se calêndula; se não, usa-se arnica. Uma regra tão
clara pode, no entanto, induzir-nos em erro, levando-nos a pensar que a
farmácia caseira se resume a apenas duas ervinhas, quando, na verdade, se
conhecem mais de quatrocentas espécies de plantas medicinais. Segue-se um
pequeno guia das plantas (para cada uma indica-se o nome comum e a
denominação científica, porquanto os nomes vulgares variam muito de região
para região) com lugar assegurado em qualquer farmácia natural, mas não se
pense que são as únicas.
Alecrim (Rosmarinus officinalis) –
As folhas estimulam a circulação e aliviam a dor. Atua sobre o sistema
nervoso e fortalece a memória. Utiliza-se no tratamento de insuficiências
hepáticas e vesiculares, uma vez que possui propriedades diuréticas. Alivia a
asma, as amigdalites e a obstrução nasal e aumenta o apetite.
Alfazema (Lavandula officinalis) –
Em tisana, alivia as dores de cabeça e acalma os nervos. Utiliza-se na asma
brônquica, na tosse, nas enxaquecas, nas gripes e em certos casos de
reumatismo.
Arnica (Arnica montana) – As suas
flores e raízes usam-se como estimulantes cardíacos, sob estrito controlo
médico, dado que se trata de uma planta tóxica. No uso externo, estimula a
reabsorção dos hematomas e tem propriedades antissépticas e cicatrizantes.
Borragem (Borago officinalis) – A
borragem é um remédio de ação suave muito apreciado na medicina popular. Para
aproveitar o efeito calmante e emoliente das suas flores, fazem-se excelentes
infusões que tratam a incómoda tosse das bronquites. Utiliza-se como
depurativo, diurético, laxativo e sudorífico.
Calêndula (Calendula officinalis e C.
arvensis) – Faz parte de numerosos preparados farmacêuticos e cosméticos
e as suas propriedades bactericidas e cicatrizantes converteram-na na planta
ideal para os cuidados da pele. Usa-se para curar feridas e limpar a pele com
acne ou descamação, nas queimaduras, nas picadas de insetos, etc.
Camomila (Matricaria chamomilla) – A
infusão das flores produz uma tisana tónica e sedativa. Usa-se no banho para
aliviar as queimaduras do sol. É habitualmente utilizada para acalmar
espasmos e convulsões, como anti-inflamatório, antisséptico, etc.
Carqueja (Chamaespartium tridentatum)
– Acalma a tosse e as irritações da faringe, sendo muito utilizada nas
gripes, nas bronquites, na pneumonia e nas traqueítes.
Cidreira (Melissa officinalis) – Em
infusão, alivia o catarro provocado pela bronquite crónica, as constipações
febris e as dores de cabeça. Utiliza-se como calmante e no tratamento de
perturbações gástricas e de dores de cabeça de origem nervosa.
Dente-de-leão (Taraxacum officinale) – É
diurético e destaca-se no combate à arteriosclerose, à celulite, à tensão
alta e ao mau colesterol. Usa-se ainda nos problemas de fígado e vesícula.
Erva-de-São-Roberto (Geranium
robertianum) – Possui propriedades adstringentes, espasmódicas,
diuréticas, hemostáticas e hipoglicemiantes. Utiliza-se em problemas de
estômago, hemorragias pulmonares ou nasais, diarreias e cálculos renais e
urinários.
Hipericão-bravo (Hypericum perforatum) – É
antisséptico, cicatrizante, diurético e sedativo. Utiliza-se na depressão, na
insónia, nas infeções ginecológicas e nas inflamações crónicas do estômago,
do fígado, da vesícula e dos rins. Além disso, ajuda nas dores musculares e
nevralgias e no herpes labial.
Hipericão-do-Gerês (Hypericum androsaemum) –
Tem propriedades diuréticas e estimula a libertação da bílis. Utiliza-se nos
tratamentos hepáticos.
Lúcia-lima (Lippia citriodora) –
Combate, sobretudo, as perturbações digestivas e nervosas. Usa-se contra as
indigestões, a flatulência e o mau hálito e como calmante.
Malva (Malva silvestris) –
Apresenta propriedades anti-inflamatórias e utiliza-se na lavagem de feridas
e como calmante sobre a pele e as mucosas inflamadas. Em infusão, usa-se em
casos de diarreia, úlceras no estômago, catarros e obstrução das vias
respiratórias, e ainda como laxativo.
Orégão (Origanum vulgare) – Em
tisana, combate a tosse, as dores de cabeça nervosas e a irritabilidade.
Utiliza-se contra a gripe, as constipações, as febres e a indigestão.
Poejo (Mentha pulegium) – Usa-se
como calmante e contra indigestões, gripes, bronquites e dores menstruais.
Não deve ser tomado durante a gravidez ou em caso de problemas renais.
Rosmaninho (Lavandula stoechas) – Tem
propriedades sedativas, antissépticas, inseticidas, cicatrizantes, diuréticas
e sudoríferas. Utiliza-se também para aliviar as náuseas e estimular a
circulação.
Salva (Salvia officinalis) –
Depois das refeições, a infusão de folhas ajuda a fazer a digestão. É
antisséptica e fungicida e contém estrogéneos. Utiliza-se contra a depressão,
as inflamações da boca e da garganta, a diarreia e os afrontamentos da
menopausa.
Tília (Tilia cordata) – Tem
propriedades diuréticas e sedativas. Usa-se contra febres, acidez gástrica e
doenças hepáticas e biliares.
Urze (Calluna vulgaris) – É
adstringente, antisséptica e diurética. Usa-se contra problemas urinários,
diversas afeções renais e hipertrofia da próstata.
Zimbro (Juniperus communis) – As
falsas bagas desta planta tiveram na Idade Média uma extraordinária
celebridade, pois supunha-se que faziam curas miraculosas. É usado como
depurativo e diurético. Entra na confeção de alguns pratos, serve para
condimentar o presunto fumado e é o principal ingrediente na preparação do gin (bebida
alcoólica destilada).
Os primeiros boticários
Durante a época
áurea dos Descobrimentos, trouxemos para a Europa, vindos dos quatro cantos
do mundo, produtos de origem vegetal, principalmente especiarias. Rapidamente
se fez sentir a necessidade de descrever tudo quanto de útil se descobrisse.
Por essa razão, foram enviados boticários nas naus que partiam a caminho de
África, das Américas e do Oriente, aos quais competia averiguar e registar
todas as mezinhas usadas pelos povos de além-mar, assim como descrever a
natureza e a origem das “drogas e cousas medicinais”, assim como as suas
propriedades e aplicações.
Nessa importante tarefa, distinguiram-se Simão
Álvares e Tomé Pires, boticários enviados para a Índia por ordem do rei D.
Manuel I, mas foi sem dúvida Garcia de Orta quem mais se notabilizou no
estudo das espécies medicinais e outros produtos originários do Índico. O seu
livro Colóquio dos simples, e drogas he cousas medicinais da
Índia..., publicado em 1563, adquiriu fama internacional,
nomeadamente após ter sido traduzido para latim, francês e italiano.
Depois do
deslumbramento com as novidades farmacêuticas e culinárias trazidas dos
“novos mundos”, o interesse dos boticários voltou-se para as potencialidades
da flora espontânea do nosso país, conhecidas desde tempos imemoriais pelas
gentes autóctones. Ainda a medicina dava os primeiros passos e já o povo
lusitano tinha remédios caseiros para a maior parte das maleitas que
atormentavam crianças e adultos.
Os estudos farmacopeicos portugueses tiveram início,
provavelmente, com o abade Correia da Serra, nascido em 1750, figura
altamente prestigiada da comunidade botânica internacional da época e
fundador da Academia Real das Ciências. Seguiram-se-lhe outras personalidades
ilustres, como Félix da Silva Avelar Brotero, nascido em 1744, Jerónimo
Joaquim de Figueiredo, autor de Flora Farmacêutica e Alimentar
Portuguesa, publicado em 1825, Francisco Soares Franco, compilador de Matéria
Médica, impresso em 1816, e Agostinho Albano da Silveira Pinto, que
publicou em 1835 o Código Farmacêutico Lusitano.
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