Antenado come cru
A chamada alimentação viva, na qual nada se cozinha, atrai uma turma esperta que não pára de crescer
As mãos de Mana Bernardes são ágeis. Todo santo dia, a designer de jóias as usa para criar peças cheias de personalidade que já foram parar no Chelsea Art Museum, de Nova York, e para lavar folhas de couve, de salsa, de repolho, de agrião, de rúcula, de serralha, de chicória, de beterraba. Logo que pula da cama, Mana começa a lidar com as verduras, os legumes e alguns punhados de sementes germinadas: lava tudo, põe no liqüidificador, bate, empurrando a mistura com a ajuda de um pepino, e, por fim, coa, usando um pano cheio de furinhos. As mãos espremem a massa verde até que jorre todo o suco num copo imenso. Só depois de sorver o líquido de cor apetitosa a moça se considera pronta para começar a tecer suas tramas delicadas do dia. A rotina se repete há exatos oito anos. Aos 18, Mana, hoje com 26, descobriu a chamada alimentação viva, a mais nova febre entre os naturebas, assim como foi a macrobiótica nos anos 70. Ela virou uma das pioneiras da onda da comida crua por uma questão pessoal. Tinha apenas duas opções: encher a cara de remédios para controlar uma inflamação crônica no intestino ou partir para a autocura pela via alternativa.Mana preferiu, literalmente, botar as mãozinhas na massa.
— Eu não acredito na doença. Acredito na saúde. Aprendi isso com a alimentação viva — diz, olhos brilhando, sorriso no rosto, sentada no charmoso jardim de sua casa, um sobrado de época em Santa Teresa. — Comecei a tomar o suco por causa de uma crise. Fiz uma dieta só do suco da luz do sol por oito dias. Eu senti tanta energia que tinha vontade de sair dançando. A partir daí mergulhei nos crus.
A guru de Mana — e de toda uma turma de bem-nascidos que estão na toada da comida crua — chama-se Ana Branco, uma professora de arte e design da PUC-Rio que resolveu criar na universidade um curso de Bio-Chip, nome pomposo para uma culinária estranha, pelo menos à primeira vista. Na tarde de um sábado, último dia 2, Ana deu uma palestra para um auditório lotado de interessados — como o diretor de TV Ricardo Waddington — em aprender que diabos, afinal, é essa tal de alimentação viva. Não é tão fácil absorver o conceito. Cabelos grisalhos e jeito moleca, a professora começou o seu discurso distribuindo sementes de trigo para a platéia. Segundo ela, uma sementinha como aquela é exatamente como um chip de computador: uma microembalagem recheada de silício, envolvido por uma molécula de água que armazena informação. Se o chip for cozido, a molécula de água se rompe e a informação se perde. O mesmo acontece com o trigo quando vai para a panela. A semente também é silício protegido por água. A Bio-Chip, então, prega um processo inusitado de preparação dos alimentos: em vez de cozinhar os grãos, a idéia é germiná-los para extrair deles todo o seu potencial nutritivo, toda a informação contida ali para gerar uma planta. E combiná-los com toda a variedade possível de frutas, legumes e verduras.
Ana faz arte com os alimentos. Seus alunos aprendem a exercitar a criatividade fazendo desenhos com tudo aquilo que é comestível na natureza.
— Quando damos água para uma semente, ela fica tão contente que bota um narizinho para fora. O grão germinado amplia o seu valor nutritivo em 20 mil vezes — anima Ana.
A professora que diz que não tem idade é só energia e analogias malucas que, pensando bem, fazem sentido. Ana associa o ato de cozinhar à guerra. Para início de conversa, ela lembra que o cozimento surgiu da necessidade dos guerreiros de amenizarem o cheiro de podre das comidas nos campos de batalha.E nós continuamos provendo guerra nos nossos corpos. Acompanhe o raciocínio: um alimento vivo é alcalino, obviamente. Cozinhar seria um processo de desnaturação e acidificação desse alimento, que, quando cai no estômago, aciona o sistema de defesa do organismo para combater uma substância chamada acrilamida, produzida pelo cozimento do amido. Tal substância gera dependência química e, por isso, temos tanta necessidade de pão com manteiga, em vez de desejar trigo germinado. Quanto mais ácido o sangue, mais necessidade de comer porcarias. À medida que o corpo é purificado, os vícios, como o de açúcar, desapareceriam. Ana criou o curso de Bio-Chip há 14 anos. No início, as aulas atraíam 15 pessoas. Hoje, as turmas têm em média cem interessados.
— Tudo o que a sociedade faz é com o paradigma da guerra. Como vai fulano? Está na luta. Ah, minha mãe é uma guerreira. Não tem como ter paz se vivemos numa guerra — diz a professora. – A s pessoas gastam toda a sua energia vital se defendendo de uma comida que o organismo pensa que é doença. A proposta é partir para a alcalinização do corpo. Um ambiente alcalino é um ambiente criativo.
Maluquice ou lucidez, Ana vem arrebanhando uma turma bacana do Rio. O casal Lula Buarque de Holanda, cineasta, e Letícia Monte, empresária e irmã de Marisa Monte, está doutrinado. Moradora da Gávea, Letícia fez o curso na PUC e já se aventurou no The Tree of Life Rejuvenation Center, a meca da alimentação viva, uma espécie de spa espartano no Arizona, nos Estados Unidos. A moça garante que foi natural entrar na barca. Aos 42 anos, é veterana das experimentações alimentares. Com 12 anos, caiu doente depois de um churrasco e parou de comer carne. Quando fez 15, conheceu a macrobiótica. O namorado da irmã Lívia era adepto e apresentou à família Monte a culinária natural. Na época, a rotina da casa passou a incluir alimentos integrais. Em 89, Letícia foi estudar nos Estados Unidos e virou fã de alimentos orgânicos, uma prática que começara timidamente no Rio. Na volta, resolveu entrar no ramo da comida. Tornou-se sócia do Ateliê Culinário, onde, apesar de servir sanduichinhos nada naturais, preocupava-se em introduzir a filosofia dos orgânicos. Agora está apaixonada pela Bio-Chip.
— Comer é uma maneira de se conhecer, de refletir sobre o mundo — acredita. — Comer é uma questão ambiental, de respeito pela vida e, claro, social. Se faço um jantar em casa, preparo opções para todo mundo. E, quando viajo, sempre me viro bem.
Em outra casa bacana da Gávea a alimentação viva se tornou o carrochefe há cinco anos. O arquiteto Hélio Pellegrino Filho mostra seus potes de sementes germinadas e sua horta com ânimo de adolescente. Diz que, por ironia do destino, tinha acabado de comprar um fogão de oito bocas quando descobriu o paraíso da comida crua. Segundo ele, os adeptos formam uma espécie de “gueto de Varsóvia”: trocam receitas, experiências, tornam-se amigos. Hélio é dado a arroubos verbais. Ele fecha os olhos para falar e transborda, com eloqüência. Para o arquiteto, filho do psicanalista e escritor mineiro Hélio Pellegrino, “as padarias são bombas atômicas”; “o ser humano está podre por dentro”; e “comer comida crua é como fazer amor com os alimentos.” Ele tem razão para o entusiasmo. Antes de abocanhar a dieta dos crus, Hélio estava gordo, envelhecido e sem energia. Cinco anos depois de fazer o curso de Ana Branco, perdeu mais de dez quilos e garante que até o seu cabelo escureceu.
— Primeiro, eu cortei a carne. E, aos poucos, fui me apaixonando pela idéia de mudar o corpo pela alimentação.Eu era um cara que tinha sal de frutas no banheiro — diz. — O que mais me impressiona é a energia que tenho hoje. Faço projetos no mundo inteiro. Ninguém tem que virar um dinossauro por conta de prazeres ilusórios. Hoje vejo os supermercados como catedrais da morte. A relação com a natureza me tirou do pedestal.
A medicina tradicional olha torto para tais radicalismos. O endocrinologista Alberto Serfaty, médico de celebridades como Vera Fischer, concorda que os alimentos crus preservam o valor nutricional e são poderosas armas contra o envelhecimento, por fora e por dentro. Só que, para ele, a verdade não é absoluta. Ou seja, tem que comer muita salada, mas também se permitir um peixinho grelhado de vez em quando. Já o nutrólogo Alexandre Merheb, responsável pela dieta do jogador Ronaldo, é completamente contra qualquer exotismo quando o assunto é comida. Desaconselha até mesmo a prática do vegetarianismo. Segundo ele, nenhum médico discute a importância do alimento vivo, mas é importante não abrir mão das convicções que já têm “jurisprudência”, como um bom bifinho acebolado. O nutrólogo João Curvo tem a mesma opinião. Ele diz que comer cru é bom, sim, mas que uma sopa à noite cai melhor do que uma salada.
— Se eu tivesse que dar uma nota para a alimentação viva, daria nota 8. Ela fica devendo ao corpo as boas proteínas. As carnes são as principais fontes de complexo B, por exemplo. Uma pessoa que come peixe pelo menos uma vez por semana previne em 25% a incidência de infarto do miocárdio — comenta Serfaty.
— Existe hoje uma implicância com as carnes. Isso é filosófico. Do ponto de vista nutricional, condenar não é boa idéia. Para a mulher, por exemplo, a carne vermelha é insubstituível, principalmente no período menstrual — completa Merheb.
A ex-dona de pizzaria Inês Braconnot, de 57 anos, e a aromoterapeuta Marta Sá, de 54, não querem saber de voltar para o fogão. A primeira havia se tornado uma especialista em antiácidos quando descobriu os crus. Vinte e seis quilos mais magra e com a pele brilhando, Inês diz que não sabe como estaria hoje se tivesse continuado a freqüentar com o ex-marido, sócio da pizzaria Fiammeta, os restaurantes badalados da cidade.
Separada e morando no Leblon, ela se diverte criando pratos vivos. Quem já foi gourmet, afinal, não perde o paladar. Já Marta teve uma experiência radical. Aos 38 anos, enfrentou uma doença grave. Seu corpo não absorvia os alimentos.Estava subnutrida, com problemas de visão e cabelos grisalhos. Os médicos não viam saída. Sem falar inglês e com pouco dinheiro no bolso, ela se mandou para o Canadá para estudar alimentação viva. Foram cinco anos de dedicação. Quem olha para Marta hoje enxerga uma mulher saudável e bem tratada. O mais engraçado é que ambas garantem: o sucão dá barato.
— A primeira vez que experimentei o suco foi na casa da Ana Branco. Passei a
noite tendo baratos — lembra Inês.
— Não sei explicar por que tomei a atitude radical de sair do Brasil doente e ir para um país desconhecido estudar uma coisa de que ninguém aqui tinha ouvido falar. Só sei que em pouco tempo lá eu rejuvenesci interna e externamente. A nutrição enzimática é uma bênção. E o suco de manhã dá um baratinho bom — comenta Marta.
Tanto Inês quanto Marta resolveram transformar a comida viva em ganhapão. Inês está escrevendo um livro. E Marta, além de dar cursos em seu apartamento, de vez em quando vai à casa de clientes especiais preparar a cozinha para a iniciação da família. O único restaurante dedicado exclusivamente à comida viva no Rio é o Universo Orgânico, no Leblon. No cardápio, toda a sorte de sucos especiais batidos com sementes germinadas e pratos caprichosamente decorados. Tudo cru.
O geógrafo Lucas Alves Ripper nem se lembra como era a vida sem o barato do suco da luz do sol. Aos 27 anos, ele come cru desde os 13. O garoto foi uma espécie de cobaia do laboratório experimental de Ana Branco na PUC. O pai dele, o professor José Luís Mendes Ripper, é parceiro da professora no desenvolvimento de design a partir da perspectiva ecológica. Lucas conta que quando criança era obrigado a ler o rótulo de tudo o que queria comer. E, por isso, não come nada processado. Sabe bem o que tem dentro das belas embalagens. Todos os dias de manhã, em jejum, ele toma um copo duplo de suco verde. Na hora do almoço, come feijão, arroz, salada e até um peixinho grelhado. E, a partir dessa refeição, só ingere coisas cruas. O rapaz, parece, encontrou o que os budistas chamam de caminho do meio. Ana Branco não acredita em tal percurso. Para ela só existe um único caminho: o radicalismo, palavra derivada de raiz.
— O que é alimentação para você? Essa é a questão. Eu vejo o alimento como energia, não como vitamina, proteína etc. Parto do princípio de que não posso agredir meu corpo. Eu sei do que preciso para ficar bem. Mas não acho que exista uma verdade absoluta para todos — diz ele.
Receita da Mana
Suco de luz do sol
Ingredientes:
•Uma maçã
•Um punhado de sementes de girassol germinadas
•Couve
•Chicória
•Salsa
•Hortelã
•Manjericão
•Espinafre
•Chuchu
•Cenoura
•Uma colher de babosa
Modo de preparo: Não adicionar água. Para ajudar a extrair o líquido, usar um pepino como socador. Coar, espremendo na chamada panela furada, um pano com furinhos que permitem passar o líquido
Receita da Letícia
Gazpacho
Ingredientes:
• 6 tomates bem maduros sem pele e sem sementes, cortados em quadradinhos
•1 pimentão vermelho ou amarelo, sem sementes, cortado em quadradinhos
•2 pepinos, sem sementes, cortados em quadradinhos
•1 talo de aipo cortado em quadradinhos
•1 cebola média cortada em quadradinhos e colocada em água gelada (para suavizar o aroma)
•3 colheres de sopa de azeite extravirgem
•3 colheres de sopa de vinagre de maçãs ou balsâmico
•½ xícara de manjericão fresco picado
•1 colher de sopa de salsinha picada
•1 colher de café de sementes de cominho amassadinhas (opcional)
•Sal a gosto pimenta fresca a gosto
Modo de preparo: Lavar e cortar os legumes. Passar na peneira as sementes dos tomates para aproveitar o suco.
Bater no liqüidificador metade dos tomates e pepinos, mais azeite e vinagre. Se necessário, acrescentar meia xícara de água filtrada para bater. Acrescentar ervas, sal e pimenta a gosto.
Misturar os legumes restantes, escorrendo a água da cebola, deixando-os em quadradinhos.
Refrigerar até a hora de servir
Receita do Hélio
Suco de castanha com jaca e cacau:
Ingredientes:
• Um copo de castanhas
•Dois copos de água de coco
•Uma jaca
•Sementes de cacau
Modo de preparo: Deixar um copo cheio de castanhas por oito horas na água. Depois, deixar a água escorrer completamente. Bater no liqüidificador com dois copos de água de coco. Coar. Bater novamente o leite extraído com a jaca e as sementes de cacau. Para adoçar, mel, passas, tâmaras ou ameixas. O bagaço que sobra no coador também pode ser aproveitado. É só temperá-lo com cebolinha, salsa, cebola, alho, azeite ou olho de linhaça e servir como patê.
Receita da Marta
Bolo de nozes com Portobelo
Ingredientes:
• 1 e 1/3 copo de nozes pecan (de molho por seis horas)
•1 e 1/3 copo de de semente de girassol germinada
•1 e 1/3 copo de amêndoas (de molho por 12 horas)
•½ copo de salsa picada
•½ copo de aipo picadinho
•2 copos de cogumelo Portobelo picado e marinado no shoyo por uma hora
•1 colher de tarragon fresca picada
•½ colher de sopa de gengibre ralado
•1 colher de sopa de cebola batida
•2 colheres de sopa de alecrim fresco sem cabo e bem picado
•1 copo de pimentão vermelho bem picadinho
•1 pitada de pimenta cayenne
•1 colher de chá de cominho em semente, bem amassado
•Azeite a gosto
Modo de preparo: Passar no multiprocessador as nozes, as sementes de girassol e as amêndoas.Acrescentar todo o resto ao patê. Pôr num recipiente de sua preferência. Tirar da fôrma e servir com salada verde farta em brotos verdes (girassol, alfafa, trevo...).
Receita da Inês
Couve-flor crocante
Ingredientes:
• ½ xícara de couve-flor picadinha
•2 colheres de sopa de cebolinha verde picada
•1 colher de sopa de aipo em cubinhos
•2 colheres de sopa de cenoura em quadradinhos
•1 colher de sopa de cebola picada
•1 colher de sopa de coentro picado
•1 colher de chá de limão siciliano salée
•1 colher de café de sal marinho com pimenta fresca
•½ xícara de gergelim hidratado por quatro horas
•Passas hidratadas para enfeitar
Modo de preparo: Misturar todos os ingredientes, enformar em pratos e desenhar com o molho e as passas.
Molho
Ingredientes:
• 1 colher de sopa de azeite extravirgem
•1 miolo de abobrinha
•1 colher de café de mostarda Dijon
•Sal a gosto
•1 colher de chá de limão
•1 colher de chá de abacate
Modo de preparo: Bater todos os ingredientes num miniprocessador, acrescentando água, se necessário, para ficar um molho espesso mas fácil de desenhar
Receita do Lucas
Creme de banana com linhaça
Ingredientes:
• Bananas
•Linhaça germinada
•Castanha-do-pará
•Passas
•Canela
Modo de preparo: Bater no liqüidificador as bananas, a canela e um punhado de sementes de linhaça germinadas.
A mistura fica com consistência de pudim. Depois, adicionar a gosto as castanhasdo-pará e as passas hidratadas
Fon te:
Powered by Publique!
A chamada alimentação viva, na qual nada se cozinha, atrai uma turma esperta que não pára de crescer
As mãos de Mana Bernardes são ágeis. Todo santo dia, a designer de jóias as usa para criar peças cheias de personalidade que já foram parar no Chelsea Art Museum, de Nova York, e para lavar folhas de couve, de salsa, de repolho, de agrião, de rúcula, de serralha, de chicória, de beterraba. Logo que pula da cama, Mana começa a lidar com as verduras, os legumes e alguns punhados de sementes germinadas: lava tudo, põe no liqüidificador, bate, empurrando a mistura com a ajuda de um pepino, e, por fim, coa, usando um pano cheio de furinhos. As mãos espremem a massa verde até que jorre todo o suco num copo imenso. Só depois de sorver o líquido de cor apetitosa a moça se considera pronta para começar a tecer suas tramas delicadas do dia. A rotina se repete há exatos oito anos. Aos 18, Mana, hoje com 26, descobriu a chamada alimentação viva, a mais nova febre entre os naturebas, assim como foi a macrobiótica nos anos 70. Ela virou uma das pioneiras da onda da comida crua por uma questão pessoal. Tinha apenas duas opções: encher a cara de remédios para controlar uma inflamação crônica no intestino ou partir para a autocura pela via alternativa.Mana preferiu, literalmente, botar as mãozinhas na massa.
— Eu não acredito na doença. Acredito na saúde. Aprendi isso com a alimentação viva — diz, olhos brilhando, sorriso no rosto, sentada no charmoso jardim de sua casa, um sobrado de época em Santa Teresa. — Comecei a tomar o suco por causa de uma crise. Fiz uma dieta só do suco da luz do sol por oito dias. Eu senti tanta energia que tinha vontade de sair dançando. A partir daí mergulhei nos crus.
A guru de Mana — e de toda uma turma de bem-nascidos que estão na toada da comida crua — chama-se Ana Branco, uma professora de arte e design da PUC-Rio que resolveu criar na universidade um curso de Bio-Chip, nome pomposo para uma culinária estranha, pelo menos à primeira vista. Na tarde de um sábado, último dia 2, Ana deu uma palestra para um auditório lotado de interessados — como o diretor de TV Ricardo Waddington — em aprender que diabos, afinal, é essa tal de alimentação viva. Não é tão fácil absorver o conceito. Cabelos grisalhos e jeito moleca, a professora começou o seu discurso distribuindo sementes de trigo para a platéia. Segundo ela, uma sementinha como aquela é exatamente como um chip de computador: uma microembalagem recheada de silício, envolvido por uma molécula de água que armazena informação. Se o chip for cozido, a molécula de água se rompe e a informação se perde. O mesmo acontece com o trigo quando vai para a panela. A semente também é silício protegido por água. A Bio-Chip, então, prega um processo inusitado de preparação dos alimentos: em vez de cozinhar os grãos, a idéia é germiná-los para extrair deles todo o seu potencial nutritivo, toda a informação contida ali para gerar uma planta. E combiná-los com toda a variedade possível de frutas, legumes e verduras.
Ana faz arte com os alimentos. Seus alunos aprendem a exercitar a criatividade fazendo desenhos com tudo aquilo que é comestível na natureza.
— Quando damos água para uma semente, ela fica tão contente que bota um narizinho para fora. O grão germinado amplia o seu valor nutritivo em 20 mil vezes — anima Ana.
A professora que diz que não tem idade é só energia e analogias malucas que, pensando bem, fazem sentido. Ana associa o ato de cozinhar à guerra. Para início de conversa, ela lembra que o cozimento surgiu da necessidade dos guerreiros de amenizarem o cheiro de podre das comidas nos campos de batalha.E nós continuamos provendo guerra nos nossos corpos. Acompanhe o raciocínio: um alimento vivo é alcalino, obviamente. Cozinhar seria um processo de desnaturação e acidificação desse alimento, que, quando cai no estômago, aciona o sistema de defesa do organismo para combater uma substância chamada acrilamida, produzida pelo cozimento do amido. Tal substância gera dependência química e, por isso, temos tanta necessidade de pão com manteiga, em vez de desejar trigo germinado. Quanto mais ácido o sangue, mais necessidade de comer porcarias. À medida que o corpo é purificado, os vícios, como o de açúcar, desapareceriam. Ana criou o curso de Bio-Chip há 14 anos. No início, as aulas atraíam 15 pessoas. Hoje, as turmas têm em média cem interessados.
— Tudo o que a sociedade faz é com o paradigma da guerra. Como vai fulano? Está na luta. Ah, minha mãe é uma guerreira. Não tem como ter paz se vivemos numa guerra — diz a professora. – A s pessoas gastam toda a sua energia vital se defendendo de uma comida que o organismo pensa que é doença. A proposta é partir para a alcalinização do corpo. Um ambiente alcalino é um ambiente criativo.
Maluquice ou lucidez, Ana vem arrebanhando uma turma bacana do Rio. O casal Lula Buarque de Holanda, cineasta, e Letícia Monte, empresária e irmã de Marisa Monte, está doutrinado. Moradora da Gávea, Letícia fez o curso na PUC e já se aventurou no The Tree of Life Rejuvenation Center, a meca da alimentação viva, uma espécie de spa espartano no Arizona, nos Estados Unidos. A moça garante que foi natural entrar na barca. Aos 42 anos, é veterana das experimentações alimentares. Com 12 anos, caiu doente depois de um churrasco e parou de comer carne. Quando fez 15, conheceu a macrobiótica. O namorado da irmã Lívia era adepto e apresentou à família Monte a culinária natural. Na época, a rotina da casa passou a incluir alimentos integrais. Em 89, Letícia foi estudar nos Estados Unidos e virou fã de alimentos orgânicos, uma prática que começara timidamente no Rio. Na volta, resolveu entrar no ramo da comida. Tornou-se sócia do Ateliê Culinário, onde, apesar de servir sanduichinhos nada naturais, preocupava-se em introduzir a filosofia dos orgânicos. Agora está apaixonada pela Bio-Chip.
— Comer é uma maneira de se conhecer, de refletir sobre o mundo — acredita. — Comer é uma questão ambiental, de respeito pela vida e, claro, social. Se faço um jantar em casa, preparo opções para todo mundo. E, quando viajo, sempre me viro bem.
Em outra casa bacana da Gávea a alimentação viva se tornou o carrochefe há cinco anos. O arquiteto Hélio Pellegrino Filho mostra seus potes de sementes germinadas e sua horta com ânimo de adolescente. Diz que, por ironia do destino, tinha acabado de comprar um fogão de oito bocas quando descobriu o paraíso da comida crua. Segundo ele, os adeptos formam uma espécie de “gueto de Varsóvia”: trocam receitas, experiências, tornam-se amigos. Hélio é dado a arroubos verbais. Ele fecha os olhos para falar e transborda, com eloqüência. Para o arquiteto, filho do psicanalista e escritor mineiro Hélio Pellegrino, “as padarias são bombas atômicas”; “o ser humano está podre por dentro”; e “comer comida crua é como fazer amor com os alimentos.” Ele tem razão para o entusiasmo. Antes de abocanhar a dieta dos crus, Hélio estava gordo, envelhecido e sem energia. Cinco anos depois de fazer o curso de Ana Branco, perdeu mais de dez quilos e garante que até o seu cabelo escureceu.
— Primeiro, eu cortei a carne. E, aos poucos, fui me apaixonando pela idéia de mudar o corpo pela alimentação.Eu era um cara que tinha sal de frutas no banheiro — diz. — O que mais me impressiona é a energia que tenho hoje. Faço projetos no mundo inteiro. Ninguém tem que virar um dinossauro por conta de prazeres ilusórios. Hoje vejo os supermercados como catedrais da morte. A relação com a natureza me tirou do pedestal.
A medicina tradicional olha torto para tais radicalismos. O endocrinologista Alberto Serfaty, médico de celebridades como Vera Fischer, concorda que os alimentos crus preservam o valor nutricional e são poderosas armas contra o envelhecimento, por fora e por dentro. Só que, para ele, a verdade não é absoluta. Ou seja, tem que comer muita salada, mas também se permitir um peixinho grelhado de vez em quando. Já o nutrólogo Alexandre Merheb, responsável pela dieta do jogador Ronaldo, é completamente contra qualquer exotismo quando o assunto é comida. Desaconselha até mesmo a prática do vegetarianismo. Segundo ele, nenhum médico discute a importância do alimento vivo, mas é importante não abrir mão das convicções que já têm “jurisprudência”, como um bom bifinho acebolado. O nutrólogo João Curvo tem a mesma opinião. Ele diz que comer cru é bom, sim, mas que uma sopa à noite cai melhor do que uma salada.
— Se eu tivesse que dar uma nota para a alimentação viva, daria nota 8. Ela fica devendo ao corpo as boas proteínas. As carnes são as principais fontes de complexo B, por exemplo. Uma pessoa que come peixe pelo menos uma vez por semana previne em 25% a incidência de infarto do miocárdio — comenta Serfaty.
— Existe hoje uma implicância com as carnes. Isso é filosófico. Do ponto de vista nutricional, condenar não é boa idéia. Para a mulher, por exemplo, a carne vermelha é insubstituível, principalmente no período menstrual — completa Merheb.
A ex-dona de pizzaria Inês Braconnot, de 57 anos, e a aromoterapeuta Marta Sá, de 54, não querem saber de voltar para o fogão. A primeira havia se tornado uma especialista em antiácidos quando descobriu os crus. Vinte e seis quilos mais magra e com a pele brilhando, Inês diz que não sabe como estaria hoje se tivesse continuado a freqüentar com o ex-marido, sócio da pizzaria Fiammeta, os restaurantes badalados da cidade.
Separada e morando no Leblon, ela se diverte criando pratos vivos. Quem já foi gourmet, afinal, não perde o paladar. Já Marta teve uma experiência radical. Aos 38 anos, enfrentou uma doença grave. Seu corpo não absorvia os alimentos.Estava subnutrida, com problemas de visão e cabelos grisalhos. Os médicos não viam saída. Sem falar inglês e com pouco dinheiro no bolso, ela se mandou para o Canadá para estudar alimentação viva. Foram cinco anos de dedicação. Quem olha para Marta hoje enxerga uma mulher saudável e bem tratada. O mais engraçado é que ambas garantem: o sucão dá barato.
— A primeira vez que experimentei o suco foi na casa da Ana Branco. Passei a
noite tendo baratos — lembra Inês.
— Não sei explicar por que tomei a atitude radical de sair do Brasil doente e ir para um país desconhecido estudar uma coisa de que ninguém aqui tinha ouvido falar. Só sei que em pouco tempo lá eu rejuvenesci interna e externamente. A nutrição enzimática é uma bênção. E o suco de manhã dá um baratinho bom — comenta Marta.
Tanto Inês quanto Marta resolveram transformar a comida viva em ganhapão. Inês está escrevendo um livro. E Marta, além de dar cursos em seu apartamento, de vez em quando vai à casa de clientes especiais preparar a cozinha para a iniciação da família. O único restaurante dedicado exclusivamente à comida viva no Rio é o Universo Orgânico, no Leblon. No cardápio, toda a sorte de sucos especiais batidos com sementes germinadas e pratos caprichosamente decorados. Tudo cru.
O geógrafo Lucas Alves Ripper nem se lembra como era a vida sem o barato do suco da luz do sol. Aos 27 anos, ele come cru desde os 13. O garoto foi uma espécie de cobaia do laboratório experimental de Ana Branco na PUC. O pai dele, o professor José Luís Mendes Ripper, é parceiro da professora no desenvolvimento de design a partir da perspectiva ecológica. Lucas conta que quando criança era obrigado a ler o rótulo de tudo o que queria comer. E, por isso, não come nada processado. Sabe bem o que tem dentro das belas embalagens. Todos os dias de manhã, em jejum, ele toma um copo duplo de suco verde. Na hora do almoço, come feijão, arroz, salada e até um peixinho grelhado. E, a partir dessa refeição, só ingere coisas cruas. O rapaz, parece, encontrou o que os budistas chamam de caminho do meio. Ana Branco não acredita em tal percurso. Para ela só existe um único caminho: o radicalismo, palavra derivada de raiz.
— O que é alimentação para você? Essa é a questão. Eu vejo o alimento como energia, não como vitamina, proteína etc. Parto do princípio de que não posso agredir meu corpo. Eu sei do que preciso para ficar bem. Mas não acho que exista uma verdade absoluta para todos — diz ele.
Receita da Mana
Suco de luz do sol
Ingredientes:
•Uma maçã
•Um punhado de sementes de girassol germinadas
•Couve
•Chicória
•Salsa
•Hortelã
•Manjericão
•Espinafre
•Chuchu
•Cenoura
•Uma colher de babosa
Modo de preparo: Não adicionar água. Para ajudar a extrair o líquido, usar um pepino como socador. Coar, espremendo na chamada panela furada, um pano com furinhos que permitem passar o líquido
Receita da Letícia
Gazpacho
Ingredientes:
• 6 tomates bem maduros sem pele e sem sementes, cortados em quadradinhos
•1 pimentão vermelho ou amarelo, sem sementes, cortado em quadradinhos
•2 pepinos, sem sementes, cortados em quadradinhos
•1 talo de aipo cortado em quadradinhos
•1 cebola média cortada em quadradinhos e colocada em água gelada (para suavizar o aroma)
•3 colheres de sopa de azeite extravirgem
•3 colheres de sopa de vinagre de maçãs ou balsâmico
•½ xícara de manjericão fresco picado
•1 colher de sopa de salsinha picada
•1 colher de café de sementes de cominho amassadinhas (opcional)
•Sal a gosto pimenta fresca a gosto
Modo de preparo: Lavar e cortar os legumes. Passar na peneira as sementes dos tomates para aproveitar o suco.
Bater no liqüidificador metade dos tomates e pepinos, mais azeite e vinagre. Se necessário, acrescentar meia xícara de água filtrada para bater. Acrescentar ervas, sal e pimenta a gosto.
Misturar os legumes restantes, escorrendo a água da cebola, deixando-os em quadradinhos.
Refrigerar até a hora de servir
Receita do Hélio
Suco de castanha com jaca e cacau:
Ingredientes:
• Um copo de castanhas
•Dois copos de água de coco
•Uma jaca
•Sementes de cacau
Modo de preparo: Deixar um copo cheio de castanhas por oito horas na água. Depois, deixar a água escorrer completamente. Bater no liqüidificador com dois copos de água de coco. Coar. Bater novamente o leite extraído com a jaca e as sementes de cacau. Para adoçar, mel, passas, tâmaras ou ameixas. O bagaço que sobra no coador também pode ser aproveitado. É só temperá-lo com cebolinha, salsa, cebola, alho, azeite ou olho de linhaça e servir como patê.
Receita da Marta
Bolo de nozes com Portobelo
Ingredientes:
• 1 e 1/3 copo de nozes pecan (de molho por seis horas)
•1 e 1/3 copo de de semente de girassol germinada
•1 e 1/3 copo de amêndoas (de molho por 12 horas)
•½ copo de salsa picada
•½ copo de aipo picadinho
•2 copos de cogumelo Portobelo picado e marinado no shoyo por uma hora
•1 colher de tarragon fresca picada
•½ colher de sopa de gengibre ralado
•1 colher de sopa de cebola batida
•2 colheres de sopa de alecrim fresco sem cabo e bem picado
•1 copo de pimentão vermelho bem picadinho
•1 pitada de pimenta cayenne
•1 colher de chá de cominho em semente, bem amassado
•Azeite a gosto
Modo de preparo: Passar no multiprocessador as nozes, as sementes de girassol e as amêndoas.Acrescentar todo o resto ao patê. Pôr num recipiente de sua preferência. Tirar da fôrma e servir com salada verde farta em brotos verdes (girassol, alfafa, trevo...).
Receita da Inês
Couve-flor crocante
Ingredientes:
• ½ xícara de couve-flor picadinha
•2 colheres de sopa de cebolinha verde picada
•1 colher de sopa de aipo em cubinhos
•2 colheres de sopa de cenoura em quadradinhos
•1 colher de sopa de cebola picada
•1 colher de sopa de coentro picado
•1 colher de chá de limão siciliano salée
•1 colher de café de sal marinho com pimenta fresca
•½ xícara de gergelim hidratado por quatro horas
•Passas hidratadas para enfeitar
Modo de preparo: Misturar todos os ingredientes, enformar em pratos e desenhar com o molho e as passas.
Molho
Ingredientes:
• 1 colher de sopa de azeite extravirgem
•1 miolo de abobrinha
•1 colher de café de mostarda Dijon
•Sal a gosto
•1 colher de chá de limão
•1 colher de chá de abacate
Modo de preparo: Bater todos os ingredientes num miniprocessador, acrescentando água, se necessário, para ficar um molho espesso mas fácil de desenhar
Receita do Lucas
Creme de banana com linhaça
Ingredientes:
• Bananas
•Linhaça germinada
•Castanha-do-pará
•Passas
•Canela
Modo de preparo: Bater no liqüidificador as bananas, a canela e um punhado de sementes de linhaça germinadas.
A mistura fica com consistência de pudim. Depois, adicionar a gosto as castanhasdo-pará e as passas hidratadas
Fon te:
Powered by Publique!
2 comentários:
Nossa quanta coisa gostosa e diferente. Não conhecia nada sobre o assunto, estou gostando de ler suas postagens.
Aos poucos, vou absorvendo.
Um beijo carinhoso
sem duvida os alimentos mortos: carne, leite,ovos,doces e refinados em geral
adoecem e matam mais que guerras e acidentes
vegetais tem tudo que precisamos
se observarmos a natureza e formos cientificos
veremos que anmais vegetarianos são mais fortes, resistentes,vivem mais
como elefante, touro, tartaruga,baleia
e os carnivoros são preguiçosos,violentos, e morrem mais cedo
somo animais também,mas podemos escolher ter saude ou doença...
Enviar um comentário